Algumas experiências marcam nossas vidas definitivamente, como divisores de águas. E o tempo de um elogio não está em um momento somente, mas está sim no eterno presente. Isto porque um reconhecimento verdadeiro, como um elogio é algo que nunca se perde; grava-se como pintura nas paredes do coração para ficar no devir eterno, soprando aos ventos. A admiração é quando luzes diversas se unem para ficarem mais fortes e luminosas. E é disto, do elogio, que ofereço aqui.
Quando houve o terremoto no Haiti eu também estremeci. Eu tinha amigos lá. Demorou-se alguns dias para se ter notícias consistentes de quem havia passado por ele, ou se perdido nele. Na minha própria comoção fiz minha inscrição junto à Associação Médica Brasileira para ser voluntário e prestar ajuda, que não foi necessária. O que pouca gente sabe é que o Coronel Cysneiros, o Tenente Coronel Alexandre Santos, muitos tantos amigos, estudamos juntos, quando eu fiz parte da ativa do Exército Brasileiro. No meu íntimo não existe um ex-militar; existe um militar da reserva. E eu saí no início ainda da Academia Militar das Agulhas Negras somente porque queria ser médico, e não por não gostar da vida militar. A maioria continuou, e o Cysneiros e Alexandre entre eles. Em uma época em que os milicos estão em baixa, em que um soldado das Forças Armadas do Brasil já não chama muita atenção entre nós cidadãos, eles estavam lá no Haiti neste dia; o Coronel Cysneiros (à esquerda) faleceu no terremoto. Estudamos todos juntos. Não me proponho agora a opinar sobre se o Brasil deve ou não ter ações militares no exterior em conjunto com a ONU; tampouco a falar sobre o que pode intimamente fazer uma pessoa comum como nós todos, um soldado, deixar sua família por ter uma missão a cumprir. Meu elogio é na verdade para espalhar o próprio depoimento deste brasileiro salvo, que como muitos por aí não perdem a vida num segundo, mas que como nem tantos (ou raros) estão dispostos a sacrificá-la por acreditar no seu país e em seus valores. E este valor é peculiar a alguém que já passou pelas Forças Armadas. Ela não serve a governos, mas ao país, à Pátria. Sem também querer revolver rumores arrepiantes e arredios do período recente dos governos militares, foram estas Forças Armadas, desprestigiadas, sucateadas, mal remuneradas, sem efetivo, que ao longo de nossa história mantiveram a unidade geográfica de nosso país, ajudaram a manter nossa língua, e que praticamente forçaram a abolição da escravatura e a proclamação da República.
Mas chega. Segue o que o próprio Alexandre escreveu, narrado na 3.a pessoa. A vivência emocional daquelas horas não podem ser computadas nem em anos, e não me cabe falar do que senti ao ler sua mensagem; é ele quem está na foto ao começo desta crônica. A vocês, suas famílias o abraço meu e de todos ao que passaram pelos portões da EsPCEx e da AMAN. E meu singelo orgulho pessoal de, mesmo distante no meio de tantos jovens que sonhavam ser oficiais há tanto tempo, sinto-me ainda próximo o suficiente para chamá-lo de amigo, pelo elo da caserna que um dia uniu nossa turma, e relembrar de modo carinhoso, mas sem denunciar negativamente, que este tenente coronel teve um singelo, espirituoso, feio e engraçado apelido de “Negusa”!
Continue na Luz, e que Deus lhe abençoe sempre! Nosso país precisa de que todos os heróis do dia-a-dia, que ainda não têm consciência de seu percorrer no mundo, acordem para que nossos filhos possam ver o futuro sem mensagens de fim do mundo, mas de prosperidade.
Quando houve o terremoto no Haiti eu também estremeci. Eu tinha amigos lá. Demorou-se alguns dias para se ter notícias consistentes de quem havia passado por ele, ou se perdido nele. Na minha própria comoção fiz minha inscrição junto à Associação Médica Brasileira para ser voluntário e prestar ajuda, que não foi necessária. O que pouca gente sabe é que o Coronel Cysneiros, o Tenente Coronel Alexandre Santos, muitos tantos amigos, estudamos juntos, quando eu fiz parte da ativa do Exército Brasileiro. No meu íntimo não existe um ex-militar; existe um militar da reserva. E eu saí no início ainda da Academia Militar das Agulhas Negras somente porque queria ser médico, e não por não gostar da vida militar. A maioria continuou, e o Cysneiros e Alexandre entre eles. Em uma época em que os milicos estão em baixa, em que um soldado das Forças Armadas do Brasil já não chama muita atenção entre nós cidadãos, eles estavam lá no Haiti neste dia; o Coronel Cysneiros (à esquerda) faleceu no terremoto. Estudamos todos juntos. Não me proponho agora a opinar sobre se o Brasil deve ou não ter ações militares no exterior em conjunto com a ONU; tampouco a falar sobre o que pode intimamente fazer uma pessoa comum como nós todos, um soldado, deixar sua família por ter uma missão a cumprir. Meu elogio é na verdade para espalhar o próprio depoimento deste brasileiro salvo, que como muitos por aí não perdem a vida num segundo, mas que como nem tantos (ou raros) estão dispostos a sacrificá-la por acreditar no seu país e em seus valores. E este valor é peculiar a alguém que já passou pelas Forças Armadas. Ela não serve a governos, mas ao país, à Pátria. Sem também querer revolver rumores arrepiantes e arredios do período recente dos governos militares, foram estas Forças Armadas, desprestigiadas, sucateadas, mal remuneradas, sem efetivo, que ao longo de nossa história mantiveram a unidade geográfica de nosso país, ajudaram a manter nossa língua, e que praticamente forçaram a abolição da escravatura e a proclamação da República.
Mas chega. Segue o que o próprio Alexandre escreveu, narrado na 3.a pessoa. A vivência emocional daquelas horas não podem ser computadas nem em anos, e não me cabe falar do que senti ao ler sua mensagem; é ele quem está na foto ao começo desta crônica. A vocês, suas famílias o abraço meu e de todos ao que passaram pelos portões da EsPCEx e da AMAN. E meu singelo orgulho pessoal de, mesmo distante no meio de tantos jovens que sonhavam ser oficiais há tanto tempo, sinto-me ainda próximo o suficiente para chamá-lo de amigo, pelo elo da caserna que um dia uniu nossa turma, e relembrar de modo carinhoso, mas sem denunciar negativamente, que este tenente coronel teve um singelo, espirituoso, feio e engraçado apelido de “Negusa”!
Continue na Luz, e que Deus lhe abençoe sempre! Nosso país precisa de que todos os heróis do dia-a-dia, que ainda não têm consciência de seu percorrer no mundo, acordem para que nossos filhos possam ver o futuro sem mensagens de fim do mundo, mas de prosperidade.
Lourenço
O SALVAMENTO DO TEN CEL ALEXANDRE SANTOS
No dia 12 de janeiro de 2010, durante o terremoto ocorrido no Haiti, o Ten Cel Alexandre Santos encontrava-se no térreo, parte externa do prédio da ONU, juntamente com outros dois oficiais e um sargento.
Quando iniciou o tremor, cada um tomou um destino, em busca de segurança. Ele e um dos oficiais correram em direção à piscina abandonada. Ao saltarem em um desnível de uns 2 metros que havia, o Ten Cel Alexandre percebeu que não daria tempo de chegar até uma área segura e decidiu encostar-se na mureta, seguindo as técnicas de sobrevivência em caso de terremotos. O outro oficial continuou correndo e, infelizmente veio a falecer.
Encostado na mureta, o tenente coronel acompanhou o desabamento do prédio sobre sua cabeça. Adotou uma posição de proteção fetal e ficou aguardando o pior, pois não acreditava poder sair vivo de uma situação daquelas. Após intermináveis segundos de muito barulho, escuridão, poeira, temor, orações e esperança, percebeu que o desabamento havia terminado e que por algum motivo ele ainda estava vivo e consciente.
Quando iniciou o tremor, cada um tomou um destino, em busca de segurança. Ele e um dos oficiais correram em direção à piscina abandonada. Ao saltarem em um desnível de uns 2 metros que havia, o Ten Cel Alexandre percebeu que não daria tempo de chegar até uma área segura e decidiu encostar-se na mureta, seguindo as técnicas de sobrevivência em caso de terremotos. O outro oficial continuou correndo e, infelizmente veio a falecer.
Encostado na mureta, o tenente coronel acompanhou o desabamento do prédio sobre sua cabeça. Adotou uma posição de proteção fetal e ficou aguardando o pior, pois não acreditava poder sair vivo de uma situação daquelas. Após intermináveis segundos de muito barulho, escuridão, poeira, temor, orações e esperança, percebeu que o desabamento havia terminado e que por algum motivo ele ainda estava vivo e consciente.
Vivo entre os escombros, fez um check-up de seu estado físico e percebeu que conseguia respirar, suas funções vitais estavam normais e que, a princípio não tinha perdido nenhum membro. No entanto não conseguia se mover, estava completamente preso. A única solução seria pedir por socorro, e foi o que fez em português, inglês e espanhol.
Após cerca de 30 minutos começou a ouvir vozes do lado de fora, acima de onde ele estava preso. Identificou-se e tentou guiar, a partir daí, o esforço de busca, mas o local em que se encontrava era de difícil acesso, centenas de toneladas de cimento, tijolos e ferro retorcido sobre sua cabeça dificultavam o trabalho das equipes de resgate.
Foram cerca de seis horas soterrado, alternando momentos de fé, esperança, dores por todo corpo, anestesia de uma das pernas, solidão, tristeza pelo futuro incerto, saudades, lamentação pelo que deixou de ser feito e principalmente pelo que deixaria de fazer junto à sua família. Durante todo esse tempo ocorreram diversos outros pequenos abalos que o deixavam muito temeroso.
Percebeu a chegada de uma equipe de resgate, vinda pela parte de trás, não conseguia enxergá-los, porém podia ouvi-los se aproximando. Ao chegarem, identificaram-se como sendo dois militares bolivianos, o tenente coronel Laredo e o tenente Sanchez. Após um breve contato e análise da situação, explicou que era mais urgente desenterrar suas pernas e assim o fizeram, com suas próprias mãos e um pequeno pedaço de ferro, pois não havia ferramentas adequadas.
Durante cerca de uma hora, permaneceram lá embaixo, junto com o Ten Cel Alexandre Santos, amparando, trazendo esperança e conforto, apesar dos abalos continuarem durante o resgate. Estes dois militares permaneceram inabaláveis na missão que haviam abraçado, o salvamento daquele brasileiro, a qualquer custo.
O militar brasileiro foi orientando os bolivianos de como ir retirando os escombros que estavam por cima dele. Após muito esforço ele conseguiu girar o corpo e fazer um percurso de cerca de cinco metros para fora dos escombros. Finalmente chegaram até a luz, onde pode finalmente ver os rostos de seus salvadores e pode agradecê-los de forma sumária, pois estava com dores e numa maca, mas sua vontade era de poder expressar todo seu reconhecimento pelo feito heróico que haviam acabado de executar.
“A estes dois bravos heróis bolivianos, eu devo a minha vida e sei que nunca terei como agradecê-los a altura, a não ser em minhas preces diárias. Se houve heróis neste desastre, dois deles com certeza são o Ten Cel Laredo e o Ten Sanches, que colocaram suas vidas em risco para salvar um oficial de outra nação, que Deus os abençoe”. Declarou o oficial brasileiro.
ALEXANDRE JOSÉ SANTOS – Ten Cel
Após cerca de 30 minutos começou a ouvir vozes do lado de fora, acima de onde ele estava preso. Identificou-se e tentou guiar, a partir daí, o esforço de busca, mas o local em que se encontrava era de difícil acesso, centenas de toneladas de cimento, tijolos e ferro retorcido sobre sua cabeça dificultavam o trabalho das equipes de resgate.
Foram cerca de seis horas soterrado, alternando momentos de fé, esperança, dores por todo corpo, anestesia de uma das pernas, solidão, tristeza pelo futuro incerto, saudades, lamentação pelo que deixou de ser feito e principalmente pelo que deixaria de fazer junto à sua família. Durante todo esse tempo ocorreram diversos outros pequenos abalos que o deixavam muito temeroso.
Percebeu a chegada de uma equipe de resgate, vinda pela parte de trás, não conseguia enxergá-los, porém podia ouvi-los se aproximando. Ao chegarem, identificaram-se como sendo dois militares bolivianos, o tenente coronel Laredo e o tenente Sanchez. Após um breve contato e análise da situação, explicou que era mais urgente desenterrar suas pernas e assim o fizeram, com suas próprias mãos e um pequeno pedaço de ferro, pois não havia ferramentas adequadas.
Durante cerca de uma hora, permaneceram lá embaixo, junto com o Ten Cel Alexandre Santos, amparando, trazendo esperança e conforto, apesar dos abalos continuarem durante o resgate. Estes dois militares permaneceram inabaláveis na missão que haviam abraçado, o salvamento daquele brasileiro, a qualquer custo.
O militar brasileiro foi orientando os bolivianos de como ir retirando os escombros que estavam por cima dele. Após muito esforço ele conseguiu girar o corpo e fazer um percurso de cerca de cinco metros para fora dos escombros. Finalmente chegaram até a luz, onde pode finalmente ver os rostos de seus salvadores e pode agradecê-los de forma sumária, pois estava com dores e numa maca, mas sua vontade era de poder expressar todo seu reconhecimento pelo feito heróico que haviam acabado de executar.
“A estes dois bravos heróis bolivianos, eu devo a minha vida e sei que nunca terei como agradecê-los a altura, a não ser em minhas preces diárias. Se houve heróis neste desastre, dois deles com certeza são o Ten Cel Laredo e o Ten Sanches, que colocaram suas vidas em risco para salvar um oficial de outra nação, que Deus os abençoe”. Declarou o oficial brasileiro.
ALEXANDRE JOSÉ SANTOS – Ten Cel